ENTRE MAR E CÉU – PARTE I – Número 69

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Por Marco Antônio Jardim

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Não. Não se vá tão precipitadamente ao encontro da noite escura.

Depois de febre, dor, náusea, indisposição, há soro, sangue e abstração.
Antibiótico, antitérmico, antídoto à dúvida sem cura.
Viver, insistentemente, é mais que ternura.
Não. Não se vá tão facilmente ao abismo da noite escura.
Tudo que vem agora é mar. E dias de brandura.
Às vezes ar, noutras brisa que esbofeteia a face.
Eu respiraria.

Antes da curva da colina, do crepúsculo da tarde ao alvorecer, há mar.
Aquela imensidão que voga sobre suas próprias águas que não absorvem azul.
Água salina próspera de vida em ouro refletido do sol nu.
Uma visão ao mesmo tempo tão leve e esmagadora quanto a respiração do iogue contemplativo.
Como numa oração celta, eu estava ali para recordar que havia sol. E era vivo.
Ali, na claridade, me vi. Te vi.

Calmo, claro, embevecido de fé, tocando os pés nos sete mares de força estranha.
Tempo, espaço e essa beleza rara de infinito azul profundo.
Um pouco à esquerda do mundo, pensamentos estrangeiros desbotados, cabelos enrodilhados atrás da nuca clara, descompromissados do calor
Vestiam colares de couro e silêncio.
Dias e marés trazendo bons companheiros, sombra, água fresca, risos e incensos.
Não. Não se vá tão apressadamente à noite escura.
Vista branco, pra iluminar as sombras da areia em reverência às urdiduras dos deuses.

Bem pode ser uma camiseta branca qualquer, com imagem gráfica de Radharani, pedindo licença à devoção.
E um pote de barro com água, também branca, a pousar em suas mãos.
Dobre as barras da bermuda alva, para que respingue água salgada de mar nas pernas nuas.
Amarre no tornozelo uma peça de cordas trançadas, de cor musgo, com uma pedra reluzente.
Perto do dia nascer, olhe, na direção do indizível, aquela cor ilimitada do horizonte.
Chore, se quiser.

Lágrima que derrama à fronte é o mesmo que sal comum à extensão de água tão imponderável que mais parece a completa ausência do ruído do mundo.

Eu, como um navio enferrujado beijando a areia, ponho-me ao seu lado, conspirando os fios da praia a esta ventura.
Não, Deus. Não se lance tão amavelmente ao curso da noite escura.



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