Especial Salvador: Bilhetes do Kaoos

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Por Mariana Kaoos

Meu tempero é outro, eu sou do azeite, pimenta de cheiro, pitada de amor:

Se tem um bairro que agrada a moçada aqui por essas terras tupiniquins, é o bairro de São Lázaro. Também pudera. Lá, além de comportar um dos campi da UFBA, é, digamos que, um dos espaços que possui um conglomerado de botecos que vendem cerveja a precinho de banana, além de cachaças famosas e comidas típicas.

Na praça principal, ou Largo de São Lázaro, o chão é de paralelepípedo, a igreja antiga e charmosa, e a vista das melhores possíveis, que mais pode ser descrita como uma panorâmica do mar da Bahia. Para quem não sabe, o padroeiro do local é um santo católico, protetor dos pobres, cuja principal característica é a de afastar as dores e o mal da vida dos homens. Dentro do sincretismo religioso, São Lázaro faz referência a Omolu, orixá das chagas e doenças no geral. Seu mês é o de agosto e ele tem a cura como principal dom, a renovação espiritual.

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Por aqui já é sabido por todos que em dia de sexta-feira, o bat encontro é sempre no Bar Omolu do Tempo, ao meio dia, para comer a tradicional e deliciosa maniçoba. Feita por Seu Raimundinho, um senhorzinho de cabelo branco e sorriso estampado no rosto, a maniçoba é iguaria disputada entre estudantes e moradores do bairro.

Calma, não estranhe. Eu sei que sexta-feira é tida como o dia de Oxalá e que grande parte dos restaurantes soteropolitanos servem o que viemos a chamar de comida baiana, ou seja, caruru, vatapá, moqueca, xinxim de galinha e assim por diante. Contudo, em São Lázaro a tradição é diferente e não menos gostosa.

Experimentei pela primeira vez na vida a maniçoba e, após dar a primeira garfada, fiquei me perguntando o porquê de demorar vinte e seis anos para provar essa delícia dos deuses. Se a sua aparência, verde e gosmenta, não é lá muito agradável, o seu gosto é inigualavel e proporciona sorrisos e surpresas existenciais.

A maniçoba é um prato indígena muito conhecido no norte do país, mais especificamente na feira do Ver O Peso, em Belém do Pará. Feita com folhas de mandioca e carnes suínas, seu preparo dura em média uma semana, tempo necessário para tirar o ácido cianídrico (venenoso) de suas folhas. Aqui na Bahia, ela já se tornou tradição no Recôncavo e, adivinhem só, no Bar de Seu Raimundinho, lá em São Lázaro.

O prato, muito bem servido, custa vinte reais e a alegria é consequência garantida. Quem vier à Salvador não pode deixar de passar por lá.

Grito de alerta:

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Um dos teatros mais tradicionais (e na minha opinião, o mais bonito) da Cidade da Bahia, é o Teatro Vila Velha. Localizado no Campo Grande, ele é enorme e oferece banquinhos, jardins, árvores centenárias, vista para o mar do Contorno, um Café cheio de guloseimas cremosas, uma sala em formato teatro italiano muito aconchegante e diversas opções culturais. Ou não.

Se nas décadas de 1960 e 1970 o Vila foi propulsor, carro chefe das grandes empreitadas artísticas do estado, atualmente ele anda respirando com certa dificuldade. Tudo isso porque falta verba para mantê-lo vivo e fértil. Uma grande pena, pois, sob a direção de Marcio Meirelles, acompanhei por anos a fio oficinas e peças teatrais de altíssima qualidade.

O Teatro Vila Velha foi o primeiro teatro independente da Bahia. Hoje em dia, ele conta apenas com o apoio do Governo do Estado, através do Fundo de Cultura. Sem qualquer outra fonte de patrocínio, o valor arrecadado não cobre todos os custos do espaço. O que isso quer dizer? Que o Vila, nesse atual momento, anda em saldo devedor e, se continuar dessa maneira, será obrigado a fechar as portas.

Bom, sem mais delongas, aqui, há de ser reconhecido que a população local, ou, ao menos, a classe artística e os consumidores de cultura, amam e querem proteger os espaços de criação e fomento que ainda existem na cidade. Por aqui anda rolando uma campanha de financiamento coletivo em apoio ao Vila. Ou seja, por aqui anda rolando uma campanha de conscientização que para salvar o nosso queridíssimo teatro a nossa participação é fundamental. Pode ser a contribuição que for, já ajuda. O Bar Quintal, que fica ao lado do teatro, já estabeleceu que o dinheiro arrecadado das cervejas consumidas todas às quintas será destinado ao Vila Velha. Bacana, não? Para saber mais informações, vocês podem entrar no site do teatro e ficar por dentro de tudo.

Oh Abelha Rainha, faz de mim um instrumento do seu prazer:

Foto: Manu Dias - GOV BA
Foto: Manu Dias – GOV BA

Existem coisas que, independente do nosso intenso desejo, não são para ser. Já outras, inimaginadas, nos assolam de repente e nos surpreendem com riso, cuidado e amor. Na noite dessa sexta-feira, 13, fui para a casa de uma amiga, querida e apaixonante, assistir pela tevê ao show de Maria Bethânia, que marcou a reabertura da Concha Acústica do Teatro Castro Alves.

Como disse anteriormente, a apresentação de Bethânia foi só para convidados, sendo grande parte desses, pessoas pertencentes à instituições de caridade. Tudo bem que a maioria dos rostos exibidos pela TVE Bahia mais estavam atrelados à elite soteropolitana do que à população carente da cidade. Contudo, como não estive presente fisicamente no espaço, vou “fazer a Gloria” e preferir não opinar.

Sendo assim, me limitarei a falar do show e da nossa Abelha Rainha. Em uma só palavra: Diferente. Digo, eu acompanho o trabalho e a performance em palco de Bethânia desde os meus treze/catorze anos de idade e, certamente que esse não foi um de seus melhores espetáculos. Pelo menos para mim, a nossa diva se mostrou cansada, com menos vigor, menos voracidade em palco. Quem já assistiu alguma de suas apresentações em Santo Amaro da Purificação, e até mesmo quem acompanha seus dvds e viu interpretações como Purificar o Subaé/Miseria, em Brasileirinho, Samba de Benção, em Tempo Tempo Tempo Tempo e Não Mexe Comigo, em Cartas Amor, sabe bem do que eu estou falando.

Alguns gestos se mostraram maquinados e sem espontaneidade. Durante a canção Olhos nos Olhos, por exemplo, Bethânia reproduziu tal e qual sua versão em Tempo Tempo Tempo Tempo (aquele momentinho gostoso em que ela abre os braços e canta “quando talvez precisar de mim, você sabe que a casa é sempre sua, vem assim”). O mesmo ocorreu com Yayá Massemba e com O Que É O Que É?.

Como se fosse um toma lá da cá, o público, por sua vez, não ficou por menos. Todos, antenados no universo virtual, pareciam mais preocupados em filmar o show para postar nas mídias sociais do que, de fato, assisti-lo. Quando a transmissão fazia uma panorâmica da Concha, só se observava as luzes dos aparelhos celulares, com brilho estatelante, em profusão pelo espaço. Uma verdadeira sociedade do espetáculo.

Por outro lado, apesar do aparente cansaço, Bethânia fez um repertório muito bacana contando um pouco da história da Bahia (Mãe Menininha e Reconvexo), além dos grandes sucessos (Fera Ferida e Negue) de seus cinquenta anos de carreira. Ah, não posso esquecer que foi maravilindo e de extremo respeito a sua homenagem ao nosso grande poeta, Castro Alves, ao recitar um trecho de seu mais famoso poema: Navio Negreiro.

Foto: Manu Dias - GOV BA
Foto: Manu Dias – GOV BA

O Festival Eu Sou A Concha vai até segunda feira e conta com apresentações dos grupos Novos Baianos, Baiana System, Ney Matogrosso e Carlinhos Brown.



Bahia, Cultura, Destaques

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