Conquista: Luiza Audaz e Trio Curimã encantam público no Canto do Sabiá

prates bonfim

Por Mariana Kaoos

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Sabe aquela sensação de quando a gente fecha os olhos e não consegue pensar em absolutamente nada?! Não consegue pensar em absolutamente nada porque estamos sentindo felicidade contemplativa em nossa existência. E aí a gente só sorri, fica com cara de besta, com os olhinhos lacrimosos diante da vida que, como já dizia Gonzaguinha, “é bonita, é bonita e é bonita”. Tenho andado meio assim ultimamente. A primavera fez meu peito desabrochar para os encontros e permanecer nos que são bons.

Um desses encontros, em especial, foi, é e provavelmente sempre será com Luiza Audaz. Porque Luiza traz uma força no olhar e uma certeza na palavra, no gesto, no canto, imprescindível. Assim como na música de Tom Jobim, ela faz cinema. Mas não só. Luiza é também cantora, compositora e intérprete das sensações mundanas. Me lembro da primeira vez que a ouvi cantar. Acho que o ano era o de 2011 e ela estava com uma blusa enorme com Janis Joplin estampada. Cabelos negros, lisos e longos, meio assim no rosto, que nem a Alanis Morissete faz. Em pé, segurando um violão enorme, que mais parecia maior que ela. A música em questão agora me falha na memória, mas provavelmente foi alguma muito boa, porque me lembro de arregalar os olhos e não piscar até que ela terminasse.

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Permanecemos amigas e íntimas por um bom tempo. Depois, sem mais nem  por que a vida fez com que seguíssemos cada uma seu próprio caminho. Eu vivi um milhão de coisas que me transformaram na pessoa que eu sou hoje, assim como ela. Nesse ano, mais precisamente a partir de julho desse ano, nos reencontramos e foi uma grande surpresa para mim. Luiza tinha acabado de chegar da Austrália. Ela tinha ficado cinco meses por lá rodando com seu trabalho autoral. Eu tinha acabado de retornar de Salvador, cheia de planos, de sonhos, de metas.

Na nossa primeira conversa, regada a cerveja e cigarros, pude perceber um pouco da maturidade profissional que Luiza tinha adquirido ao longo desse tempo. Ainda naquele mês a proposta era de realizar um show, intitulado Gal Canções, no Café Society. Acompanhada do Trio Curimã, grupo instrumental formado por Davi Brandão, Eric Lopo e Kayque Donato, Luiza iria fazer uma releitura da obra de Gal Costa a partir da sua percepção sobre a cantora. Como de se esperado, foi um sucesso e a dose se repetiu outras vezes.

Continuei acompanhado algumas apresentações dela na cidade e, em meio a todas, comecei a ouvir o seu trabalho autoral. Aí constatei a força que ele possui e a necessidade de expandi-lo para que mais pessoas conheçam. Nesse ultimo domingo, por exemplo, rolou lá, no Canto do Sabiá, uma apresentação sua baseada no seu ep Menino Blue. E falando um pouco mais disso, vamos lá ao que interessa.

Sabiá, fotografo e agora dono de bar, é gentil, educado, brincalhão e atento aos nomes culturais que circulam pela cidade. Ir ao Canto é sempre uma experiência feliz. As pessoas que trabalham por lá nos servem com muita delicadeza e sorriso estampado no rosto. A cerveja é gelada, os passarinhos cantam e as conversas são precisas, certeiras, poéticas. Nesse domingo não foi diferente. Já saí de casa empolgada, só por ter me programado para ir para lá.

O show, como já dito, seria de Luiza e Trio Curimã, com participação especial do dj Rodrigo Freire (o que, por sinal, deu uma roupagem maneiríssima às músicas). O horário não foi legal, isso é um fato. Estava marcado para as 16 horas e, a gente há de convir que dia de domingo é muito mais bacana quando saímos cedo, almoçamos juntos, contemplamos o sol, bebemos cerveja e nos divertimos. Contudo, mesmo sendo fim de tarde, nada disso deixou de acontecer.

Acho bacana ofertar um paragrafo inteiro para falar do Trio Curimã. Os meninos tem um requinte impecável. Tocam bossa nova, tocam jazz, tocam blues, tocam samba e o que mais vier. Kayque, na bateria, é um eterno apaixonado. As expressões que ele faz ao manusear o instrumento são tão puras que comovem a quem está olhando. Eric, por sua vez, é mais sério, porém não menos importante. Ele demonstra domínio total sobre o baixo e dá ritmo às canções apresentadas. Por fim, Davi é engraçado. Quando faz solo na guitarra, se remexe, se contorce por inteiro. É como se a música entrasse em seu corpo e ele deixasse de ser gente para virar som.

Os três dialogam muito bem com a voz e o estilo de Luiza. No domingo ela cantou Gal, Jards Macalé, Fino Coletivo e suas próprias músicas. Todo o repertório foi muito bem trabalhado, ou melhor dizendo, foi fatal. Tudo bem que o meu estilo musical se assemelha em 100% com o de Luiza e, por conta disso, eu acabo puxando a sardinha, mas tentando pensar além, o que ela cantou foi profundo porque é nosso, é brasileiro, fala da nossa realidade, da nossa compreensão de mundo.

Não sei se foi eu ou se realmente aconteceu dessa maneira, mas parece que do meio do ano para cá os artistas da cidade resolveram se movimentar. Importante ressaltar que se movimentar sem um apoio sequer do poder público municipal. Apresentações foram pensadas, ideias trocadas, cultura produzida, disseminada e consumida nas mais diversas instancias. O Café Society, o Canto do Sabiá, o Aquarius Gourmet, o Teatro Carlos Jehovah,  o Janela Cajaíba e mais alguns outros passaram a ser ocupados com veemência por esses músicos, cantores, instrumentistas que, ao contrário do que muita gente pensa, não estão parados. Ah, mas não estão mesmo!

Luiza é uma delas e que bom que ela seja! Ter comparecido ao Canto do Sabiá no domingo e ter assistido à sua apresentação me fez perceber que estamos trilhando o caminho certo, que é necessário se fazer ser na cena cultural de Vitória da Conquista e que para que essa mesma cena permaneça fértil e viva ela depende unicamente da nossa junção, público e artistas, ocupando, produzindo e reverberando. Que venha mais!



Cultura, Vitória da Conquista

Comentário(s)


One response to “Conquista: Luiza Audaz e Trio Curimã encantam público no Canto do Sabiá

  1. Kaoosinha,

    Eu tenho absoluta certeza de que os artistas e produtores culturais de Vitória da Conquista se movimentam com muito mais criatividade e audácia,justamente porque estão livres das inúmeras restrições geralmente impostas pelo “apoio” do poder público municipal.
    Portanto, que os artistas e produtores ousem com independência e que o público e os jornalistas prestigiem os ótimos espetáculos promovidos nesta primavera em Vitória da Conquista.
    Esse é o caminho do diálogo entre o talento sem amarras e o reconhecimento plural.
    Bjs,

    Dirceu Góes

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