Você é peixe?

Por Elen Vila Nova

As redes sociais nos ocupam. Ocupam muito. Acredito que todos temos (sic) pensado sobre isso e questionado nosso comportamento diante das telinhas.

O que talvez você com mais de trinta anos, como eu, não tenha parado para pensar é que redes sociais sempre existiram. Com recursos digitais ou analógicos sempre fomos carentes delas: das redes, dos entrosamentos, do voyerismo, das fofocas.

Na minha adolescência, escrevíamos cartas para as colegas, as melhores amigas. Papéis especiais – havia inclusive os cheirosos! -, desenhos, e muita emoção. Entregávamos a cartinha na chegada ou na saída da aula. E a lei era: "só leia quando chegar em casa!

Quando a resposta era rápida, ela vinha no outro dia: olha lá a cartinha! Uma delícia de pegar, de ler, de guardar. Hoje somos mais práticos. Rápidos. Instantâneos, eu diria.

Envio msg p vc.
Vc resp.
Na mesma hora. No mesmo minuto. No mesmo segundo?
E quem disse que não há emoção nestas missivas da atualidade?
  :/ xxxx
E a produtividade da emoção vai muito além da Era da reprodutibilidade técnica*. Cópias são compartilhadas com uma velocidade que mimeógrafo algum poderia imaginar um dia ser possível alcançar. Falamos-para-todo-mundo-ao-mesmo-tempo- agora-mesmo-que-pareça-que-minha-mensagem-tenha-sido escrita-para-uma-só-pessoa. Mesmo-que-pareça-que-só-tirei-uma- foto-bonita-minha-para-guardar-para-mim-mesmo. Mesmo-que- pareça-que-fotografei-o-bolo-da-tarde-para-comparar-com-o-bolo- que-vou-fazer-com-a-mesma-receita-que-peguei-com-o-garçom-da- cafeteria.

Tudo comunica. E agora nos comunicamos de maneira eficiente e eficaz.
Será?
É certo dizer que nas redes só somos o que queremos ser?
Sim.
Mas quem disse que na vida é diferente?
Nas relações sociais somos assim. Sempre fomos. Acho até que as tais redes cibernéticas só colocaram uma lente de aumento neste ponto de vista. Ninguém sai de casa de pijama, com a cara amassada, aparentando ódio do mundo. A gente se arruma, coloca a roupa que mais combina; com o que queremos parecer ser, um batonzinho para ficar mais bonita e vale até o perfume, pois também queremos marcar nossa presença no olfato das pessoas.

Por que nas redes sociais seríamos a sinceridade em forma de bytes?

No nosso dia a dia não somos sinceros. Ou somos? A gente disfarça, a gente se apruma, a gente quer que o outro acredite que somos nosso melhor. Que estamos ótimos, lindos, sorridentes! Na padaria, no shopping, na boate, enfim, no teatro da vida. Ninguém fica chorando as pitangas para o mundo ver!

Ninguém fica dizendo que ganha mal e que a vida tá uma merda! Ninguém fica espalhando que tá se achando horrorosa! Aliás, quase ninguém.

Há quem vá para o lado oposto. A glória da tristeza. Lamentam estar sozinhos. Lamentam estar descontentes com o trabalho. Lamentam ter que ir para academia. Lamentam não ter o que fazer. Tudo com muito glamour, foto com filtros de surpreender… Ninguém é de ferro e quer, sim, parecer de porcelana.

Podemos ser o que quisermos e, que maravilha!, fazer todo mundo acreditar que somos aquilo tudo mesmo… Tem gente que quer ser culto, tem gente que quer ser engraçado, há quem queira ser do contra. Há os que prefiram parecer gostosos (ângulos e filtros estão aí para isso!) Igualzinho como sempre foi. Et Voilá!

E ainda conseguimos as particularidades que sempre alcançamos: os melhores amigos ganham o privilégio de lerem nos inbox ou direct messages  da vida virtual coisas que ninguém mais pode acessar  (semelhante à troca de agendas entre amigas, lembram, meninas?); alguns veem fotos que não mostramos a outros. Alguns recebem até nudes! Bem fez a Playboy em desaparecer do mapa.

Enfim, recursos novos utilizados tão somente para sustentar e revigorar as mesmas formas de antigamente. Porque ainda somos os mesmos, como nossos pais, que foram como nossos avós.  É o dantes no quartel de Abrantes. Tudo novo de novo. E de novo, de novo, de novo…

Um beijo.Ou melhor: :* (é assim?)
*Uma menção ao ensaio “A obra de arte na era de
reprodutibilidade técnica”, de Walter Benjamim.



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