Opinião: O Confinamento da Razão e da Política

Por *Cristiano Santos (o Ruivo)

Em plena aurora do século XXI, no alvorecer do terceiro milênio, o mundo amanhece, dia após dia, atônito com a necessidade de lidar com um cenário quase que apocalíptico.

Digno de enredo de filmes de ficção científica, os efeitos a saúde coletiva e os desdobramentos sócio-econômicos, provenientes da pandemia causada pela variação de um zoovírus da família Corona, o COVID 19, coloca as nações mergulhadas numa realidade em que é escaneada o alto custo de se viver numa sociedade globalizada, cujo modelo predatório de produção, ignora o equilíbrio ambiental e os limites da ética.

Num momento de tamanha apreensão por parte de todos, os cidadãos e cidadãs que compõem a sociedade brasileira, deparam-se de forma ainda mais voraz com o medo e a apreensão, haja vista a falta de prognósticos oficiais a respeito do que de fato se irá enfrentar no país.

A medida que avança os números da contaminação no vasto território brasileiro, percebe-se o distanciamento em que nossa nação se encontra em relação ao restante do mundo.

Em todos os países, se percebe chefes de Estado, chamando a responsabilidade para si e adotando medidas, que independente dos resultados prejudiciais ao bom funcionamento da economia a curto prazo, garantem o combate ao avanço da pandemia, causada pelo vírus COVID 19.

Veja o que declarou aos alemães, Angela Merckel, primeira ministra daquele país, chefe de Estado e Governo alemão.

“Caros cidadãos,

O corona vírus está atualmente mudando a vida em nosso país de modo dramático. Nosso conceito de normalidade, de vida pública, de interação social – tudo está sendo testado como nunca antes.

Milhões dentre vocês não podem ir trabalhar, seus filhos não podem ir para a escola ou para a creche, teatros e cinemas e lojas estão fechadas e, talvez, o mais difícil: nós todos perdemos os encontros que são normalmente considerados usuais. Evidentemente, em uma situação como esta, cada um de nós está repleto de perguntas e preocupações sobre como seguir em frente.

Eu me dirijo a vocês hoje, deste modo incomum, porque eu quero dizer a vocês o que me guia como Chanceler e o que guia todos os meus colegas no Governo Federal nesta situação. Isto faz parte de uma democracia aberta: que nós também tomemos decisões políticas transparentes e as expliquemos. Que nós justifiquemos e comuniquemos nossas ações o melhor possível de modo que elas sejam compreensíveis.

Acredito firmemente que nós seremos bem sucedidos nesta tarefa se todos os cidadãos a entenderem verdadeiramente como tarefa deles. Deste modo, deixem-me dizer: isto é sério. Levem a sério também. Desde a unificação alemã… não, desde a Segunda Guerra Mundial, não houve desafio para nosso país em que nossa ação conjunta fosse tão importante.

Eu gostaria de explicar para vocês em que pé as coisas estão no que diz respeito à epidemia, o que o Governo Federal e as demais instâncias de governo estão fazendo para proteger todo mundo em nossa comunidade e limitar os danos econômicos, sociais e culturais. Mas eu também gostaria de explicar a vocês por que vocês são necessários e o que cada um e todos podem fazer para contribuir”.

Infelizmente, em nosso país o Governo Federal, na figura do chefe do executivo nacional, demonstra distanciamento daquilo que orientam as autoridades mundiais e certa irresponsabilidade na condução da crise.

Salvo a equipe do ministério da saúde, que sob o comando do Henrique Mandeta, vem atuando bem no que tange a garantia de respostas, tal como a manutenção do funcionamento da rede de atendimento – postos de saúde, unidades de saúde e hospitais – os demais ministérios do governo não estão atuando ou estão atuando de forma tímida ou equivocada.

Pior que isso, percebe-se nas falas do presidente e em medidas da ala econômica do governo, uma total falta de conhecimento técnico a respeito das causas, difusão e consequências do COVID 19, tanto do ponto de vista da infecção individual, quanto do ponto de vista do contágio coletivo e avanço da pandemia, bem como, considerando-se o provável cenário de crise econômica e desabastecimento.

Vide algumas declarações do presidente feitas publicamente nos últimos 7 dias:

“Vão morrer alguns. Sim, vão morrer (…) Mas não podemos deixar esse clima todo que está aí. Prejudica a economia. A chuva está vindo aí, você vai se molhar, agora se você botar uma capinha aqui, tudo bem, passa, agora se você entrar em parafuso, você vai morrer afogado embaixo da chuva.”

“Eu não trabalho com projeções de números, não interfiro no trabalho do Luiz Mandetta, nosso ministro da Saúde, eu vejo os números que partem de lá, dessas projeções, e to achando que há um exagero nisso daí.”

“Brevemente o povo saberá que foi enganado por esses governadores e por grande parte da mídia nessa questão do Corona vírus “.

É de causar perplexidade a arrogância, egoísmo e irresponsabilidade, através da qual o presidente da república encara o início da pandemia junto ao Brasil.

Em nome da proteção da economia, já cambaleante em nosso país antes mesmo de surgirem as primeiras notícias da doença Sars – Cov 19, se ignora a necessidade de executarmos protocolos rígidos de segurança individual e coletivo, que garantam o direito a vida.

Não há liderança numa cadeia de comando em escala federal, pior, não há nem mesmo uma cadeia de comando federal, que atue a nível nacional e com jurisprudência em todo território brasileiro.

Enquanto no mundo, observa-se esforços para evitar o colapso econômico, viabilizando a prestação de serviços básicos que movimentem a cadeia produtiva, a manutenção dos salários e a garantia de manutenção de padrões mínimos de dignidade para os trabalhadores, no Brasil, acontece exatamente o contrário.

No país tupiniquim, ao invés de se utilizar das reservas cambiais do banco central ou o dinheiro do BNDES, para subsidiar empresas, serviços e trabalhadores, o que houve, em pleno domingo, sem debate ou transparência, foi a edição de um decreto presidencial que permite o empregador suspender contrato de trabalho e o salário dos empregados, por pelo menos 4 meses.

No meio da crise, no olho do furacão, todos os países estão subsidiando 80, 90,100% do salário dos trabalhadores.

Em Portugal, o governo irá pagar até 84% do salário, com o trabalhador em casa. No Reino Unido, para quem recebe até 2,5 mil euros, será garantido pelas autoridades governamentais, o pagamento de 80% do salário. Até mesmo na Venezuela, país apontado como comunista e, por isso, considerada sinônimo de derrota e atraso por inclinações partidárias de direita, o governo decretou que irá garantir, ele próprio, o pagamento de 100% dos salários e que está terminantemente proibida as demissões até o final do mês de dezembro deste ano.

No Brasil, os esforços, ficaram a cargo dos governadores, que independente de questão político partidário, vem atuando na garantia do cuidado com suas populações e na preservação da vida através da implementação de medidas de contenção do vírus.

João Doria do PSDB em São Paulo, Witzel do PSC no Rio de Janeiro, Rui Costa na Bahia e Camilo no Ceará – ambos do PT, Flávio Dino do PCdoB no Maranhão, o governador do Pará, Paraná, Santa Catarina, todos estão tomando as medidas necessárias para garantir o isolamento social (única arma que temos para combater a pandemia na falta de um medicamento atestadamente eficaz no combate ao COVID 19) e concomitantemente, viabilizar a prestação dos serviços básicos de interesse público.

Enfim, num momento em que as autoridades são chamadas a mostrar a que veio, a sensatez, o discernimento, empatia, sensibilidade e acima de tudo, conhecimento técnico aprofundado a respeito dos fatos e desdobramentos dos fatos, devem imperar no momento de tomada de decisões.

Tudo ao contrário disso demonstra desgoverno, implementa a desinformação, aumenta a desconfiança e, definitivamente, não ajuda em completamente nada.

Em vista de tamanha demonstração de despreparo e pequenez moral e ética, por parte daqueles que se esperava a manutenção serena do controle da crise epidemiológica, de saúde e financeira, cabe aqueles que se preocupam incondicionalmente com a vida das pessoas, criticizar as questões que emergem da realidade e propôr alternativas que colocadas em prática, repercutirão positivamente na atenuação dos efeitos da pandemia em todas as suas dimensões.

Seguem abaixo algumas medidas que observo como eficazes na lida com o cenário de crise que se descortina em nosso país:

1° medida:
Montar um comitê de gestão da crise, formada pelo presidente da república, chefes de ministério diretamente ligados a crise (saúde, desenvolvimento regional, justiça, economia, ciência e tecnologia, defesa, transportes e educação), diretores da ANVISA, IPEA, IBGE,, Defesa Civil, chefes do Estado maior (exército, marinha e aeronáutica), governadores dos estados da federação e mais 3 dos melhores profissionais (um homem e duas mulheres), das seguintes áreas: epidemiologia, infectologia, saúde pública e coletiva, economia, sociologia, geografia, estatística, planejamento estratégico, biomedicina, química, engenharia de trasportes.

Obs.: O comitê se reuniria por videoconferência a cada três dias para monitorar a crise. O grupo definiria suas decisões de forma democrática, por meio de votação, sempre acompanhando aquilo que apontasse dois dos três profissionais de cada área. Teria alcance nacional, a medida que a jurisprudência das decisões abarcariam todo território nacional.

2° medida:
Contratação imediata, em caráter extraordinário, de profissionais da saúde e ligados ao funcionamento hospitalar. Garantia de aporte de recursos financeiros emergenciais para serem investidos no SUS.

Obs.: O dinheiro viria dos fundos partidário, orçamento da união e doações compulsórias do setor privado bancário.

3° medida:
Montar hospitais de campanha nos estádios de municípios polos regionais, ou com mais de 50 mil habitantes e em surto. Faria um levantamento e ativaria hospitais, leitos de UTI e unidades de saúde fechados em todo país.

4° medida:
Utilização de escolas públicas como alojamentos para pessoas em situação de rua, com a garantia da higienização dos mesmos e disponibilização de três refeições ao dia, viabilizando ainda, conscientização do público atendido.

Obs.: O custo seria das prefeituras e empresariado local. Professores e profissionais da rede de atenção social dos municípios seriam os responsáveis por executar tal.medida.

5° medida:
Fechar portos, aeroportos e fronteiras terrestre, aérea e marítima, garantindo por meio do exercício das forças armadas, polícia federal e força nacional, a execução da medida.

6° medida:
Decretar o isolamento social compulsório, com a saída de casa permitida apenas para garantia das necessidades básicas, ou seja, a compra de alimentação e remédios, sob a pena de fiscalização e multa em caso de descumprimento da norma.

7° medida:
Garantir a execução da prestação de serviços básicos coletivos, tais como, fornecimento de água, energia elétrica, internet e saneamento básico.

8 medida:
Garantia de manutenção do transporte de cargas consideradas essências, ou seja, alimentação, bem como, insumo, material e equipamentos hospitalares, além de combustíveis.

9° medida:
Passar temporariamente o controle total das estradas – inclusive das federais – ferrovias, portos e aeroportos, para os governadores dos estados.

Obs.: Junto com as rodoviárias, e centrais de abastecimento, todos estes espaços seriam monitorados pelas polícias estaduais, sendo permitido apenas o translado de profissionais da saúde, enfermos e o transporte de cargas consideradas estratégicas e essenciais. Os motoristas seriam monitorados a cada fronteira entre Estados, primeiro sinal de infecção, seriam isolados.

10° medida:
Cadastramento online dos trabalhadores desempregados ou na informalidade, acompanhado da criação de um fundo para o pagamento de 3 mensalidades (podendo ser estendido por mais 2 meses), no valor equivalente a um salário mínimo.

Obs.: Este dinheiro seria oriundo das reservas em dólar do Estado brasileiro, mantidos sob a gestão do Banco Central do país. Hoje os valores somam mais 356,9 bilhões de dólares. Da mais de 1 trilhão de reais.

11° medida:
Criação de um fundo de investimentos e abertura de linhas de créditos, para minimizar os efeitos da crise e prejuízos junto ao setor produtivo (indústrial e agropecuário), de serviços, bem como, comercial.

Obs.: O dinheiro deste fundo viria do BNDES.

Refletir a luz da crítica se faz extremamente necessário.

Chega de engôdos políticos, sandices extremistas e mirabolâncias imbecis, que versão em águas rasas, uma realidade extremamente complexa e que exige um mergulho analítico mais profundo.

Observemos a realidade, o sistema do Capital é inviável e insustentável em todas as suas dimensões.

É ambientalmente insustentável.
É humanamente mortífero.
É socialmente violento.

*Cristiano Santos (o Ruivo)

Professor de Geografia – SEC Bahia

Membro pesquisador do Grupo de Estudos e Pesquisa Estado, Capital, Trabalho – GEPETC / UESB

Coordenador do Grupo de Estudos Avançados e Formação Política GEAFP / CELEM – Mirante

Coordenador do Programa de Estudos em Geopolítica e Atualidades – PEGA Pré-vestibular / CELEM – Mirante



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