Dia do Trabalhador: que haja pão em todas as mesas!

Por Mozart Tanajura Jr[1]

“Trabalhadores, trabalhadoras, Deus também é trabalhador!” (Pe. Zezinho)

1º de maio, dia do trabalhador. Não é à toa que a Igreja Católica neste dia também celebra a festa de São José Operário. Diz-nos a história cristã que São José, pai adotivo de Jesus, era carpinteiro e, portanto, trabalhador, operário … homem simples e justo, conforme descrição bíblica e da própria tradição eclesial ao longo dos séculos. Como todo trabalhador pobre,, suava para ganhar o seu sustento e o de sua família. Não se dobrou diante dos poderosos; aprendeu a subverter a ordem injusta estabelecida para proteger o menino Jesus, como missão que recebeu da parte do Pai Eterno. Ah se não fosse o espírito subversivo do casal sagrado Maria e José ao não acreditar nas ordens nefastas de Herodes! Fugiram sim! Mas não uma fuga covarde; fugiram para não entregar o recém-nascido nas mãos daqueles que, por poder e riqueza, tudo fazem, até mesmo se preciso for vendem as suas próprias almas ao mal.

A perseguição ao menino Jesus foi dura e cruel: diversas crianças menores de dois anos foram assassinadas pelas mãos dos facínoras, carrascos e cumpridores de uma ordem contrária à vida e ao projeto de Deus. No entanto, São José, ao lado de Maria, não hesitou, nem vacilou: prosseguiu com sua missão. Educou o Menino Jesus e o ensinou na escola da vida o respeito ao próximo e a dignidade do trabalho. A prova disso é que Jesus, mesmo sendo Deus, trabalhou humanamente e aprendeu a profissão de José, tornando-se também carpinteiro. Por isso, com razão, a Igreja celebra o dia de São José e o identifica como um trabalhador, um operário, assim como nós, trabalhadores, que lutamos dia a dia por nosso pão e sustento, não sobrando nada, muitas vezes, para outras dimensões do viver tão necessárias à dignidade humana: saúde, educação, moradia, cultura, lazer…

Fugimos o tempo todo estrategicamente dos vários herodes que tentam matar o que há de mais valioso dentro de nós: a convicção de que o mundo pode se transformar numa nova realidade de vida em abundância para todos com igualdade de condições e oportunidades.

Padre Zezinho, grande compositor e cantor, no final da década de 90 gravou e encantou-nos com uma linda canção dedicada aos trabalhadores. A música nos apresenta uma prece a Deus, pedindo a bênção a todos os trabalhadores e trabalhadoras. Ao longo da letra, constatamos também uma reflexão do compositor que leva cada categoria de trabalhadores a refletir sobre si mesma em relação ao próximo. Chama-nos à atenção o trecho: “Trabalhadores, trabalhadoras, Deus também é trabalhador!” (Pe. Zezinho). Deus é trabalhador! Trabalha o tempo todo e quer necessitar de nossas mãos, não que Ele tenha necessidade de algo, pois sendo Deus não necessita de nada, mas quer, deseja, chama-nos, convida-nos a emprestar nossas mãos trabalhadoras para construir já nesta terra o Reino e a torná-lo pleno somente na eternidade.

Mas quantas mãos estão distantes do trabalho de Deus? Quantas mãos que se sujaram na lama da corrupção que já não atendem ou nunca atenderam ao chamado de Deus? Que mãos são estas que exploram o trabalhador?!  E, como se não bastasse, oprimem e matam o sonho de milhões de operários confinados a um subemprego sem as condições necessárias para se manterem, ganhando até menos do que um salário mínimo por uma jornada de trabalho extensa e desgastante, enquanto que os poderosos ou bajuladores do sistema excludente se banqueteiam com altos cargos e salários. Essa ordem é perversa! Não faz parte do sonho de um Deus trabalhador. É a mesma ordem do tempo de Herodes em que se tentava aniquilar o sonho do Reino dos Céus ao perseguir crianças indefesas e desprovidas da força do poderio dos senhores deste mundo.

A exemplo da perseguição de Herodes, aniquila-se o trabalhador quando leis estranhas à Doutrina Social da Igreja passam a vigorar num país alastrado por uma grave crise social e econômica às custas de pobres cada vez mais pobres, aumentando, assim, o fosso da desigualdade entre os cidadãos que teoricamente deveriam ter os mesmos direitos. Essa não é a lógica do Reino! Também não é a lógica a ser celebrada neste dia tão especial dos trabalhadores! Por isso, a nossa indignação: Como celebrar o Dia do Trabalhador sem profetizarmos com o cantor católico Zé Vicente? Assim diz a canção deste compositor nordestino:

“As forças da morte
A injustiça e a ganância de ter, de ter
Agindo naqueles que impedem
Ao pobre viver, viver

Sem terra, trabalho e
Comida a vida não há – não há
Quem vive assim e não age
A festa não vai celebrar”

No Dia do Trabalhador, não nos enganemos com discursos vazios daqueles que detêm o poder e nada fazem para pelo menos amenizar o sofrimento de tantos trabalhadores e trabalhadoras em nosso país. Alenta-nos um dos versos da mesma canção de Zé Vicente, e, com ela, cantemos em coro a fim de ao menos termos esperança em dias melhores sobretudo neste Tempo Pascal que ainda celebramos:

“Irmãos companheiros na luta
Vamos dar as mãos, as mãos
Na grande corrente do amor
Na feliz comunhão, irmãos

[…]

Pão em todas as mesas
Da Pascoa a nova certeza
A festa haverá
E o povo a cantar, aleluia”

Assim, quando tivermos pão em todas as mesas, trabalho digno e justo para todos, e não houver uma só pessoa que passe fome e frio, teremos motivos para celebrar o Dia do Trabalhador. Do contrário será mais um dia de descanso, pois, se não fosse a voz dos subversivos do sistema capitalista, nem isso seria mais, seria apenas um “dia produtivo”, sem mesmo o direito ao descanso! Pensemos nisso!

[1] José Mozart Tanajura Júnior é mestre em Letras e especialista em Filosofia e em Teologia Contemporânea. Palestrante nas áreas supracitadas, tem se dedicado ao estudo da Doutrina Social da Igreja e  da relação Ética e Gestão Pública.



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