Conquista: Saiba como foi o Festival ‘Próxima Estação’

novo horizonte

Por Mariana Kaoos

Fotos: Amanda Nascto
Fotos: Amanda Nascto

Alô alô queridões de todo esse vasto e fértil Brasil varonil. Já se recuperaram dos agitos do fim de semana? Aliás, me digam aí, como vocês passaram esses dias? Aqui em Vitória da Conquista a programação cultural ardeu feito brasa de carvão. Tivemos um tanto de coisa boa nos quatro cantos da cidade, dentre elas, para mim, a maior e mais deliciosa produção dos últimos tempos. É óbvio que vocês já sabem que eu estou falando do Festival Cultural Próxima Estação, evento da Adusb em parceria com o Coletivo Suiça Baiana.

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Todos os anos a Adusb realiza uma festa voltado para a confraternização dos professores. Um rega bofe dos bons que mescla gastronomia, música e muitas conversas politizadas, acadêmicas e sociológicas. Agora em 2016, a associação resolveu fazer diferente e abrir um espaço, visando um possível dialogo com a comunidade conquistense. O resultado foi o Festival que reuniu programação vasta, com exibição de vídeos, teatro, manifestações precisas e imprescindíveis (leia-se Fora Temer e #apecdofimdomundo!), momento infantil e muita, mas muita música boa.

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Infelizmente não conferi todos os espaços. Contudo, os que pude presenciar foram de uma riqueza sem tamanho. Nesse sábado, 15, quem subiu ao palco por volta das 18horas foi o grupo conquistense Ciclanos de Tais. Comandado pelo vocalista Fillipe Sampaio, o show foi um desbunde total. Tem um certo tempo que venho percebendo isso, mas nunca tive, até então, a oportunidade de comentar: Fillipe tem, cada vez mais, produzido um trabalho fantástico que vai desde a questão de composições e melodias autorais, ate a performance em palco e sutilezas, brincadeiras com identidade e gênero.

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Com grandes argolas na orelha e um batom preto fechação, o cantor iniciou o show recitando um poema e, na sequência, apresentou ao público, atento e curioso, um repertório centrado nas suas mais bonitas e ricas composições. Em determinado momento do show, quem subiu ao palco como convidada especialíssima foi a cantora, compositora, atriz e poetisa Ana Barroso.

E o que falar de Ana? Bom, certamente que ela tem uma presença tão intensa que, ainda que de maneira inconsciente, acaba roubando todos os olhares para ela. Eu sou suspeita para falar tanto dela quanto de Fillipe, pois admiro profundamente o comprometimento artístico e cultural que ambos têm em todas as suas instâncias sociais e pessoais. No entanto, ouso afirmar que a cumplicidade e sintonia dos dois é algo muito bonito de se ver. O ponto alto foram as canções Meu Barraco e Senhora de Todos os Ponteiros, que Fillipe interpretou sozinha e de maneira sublime.

Dando sequência à programação, a cantora baiana Larissa Luz entrou em cena e deixou a todos escandalizados com a sua força como mulher e cantora. Aqui, se faz imprescindível elencar algumas questões:

– Larissa tem um repertório completamente empoderado e, por que não dizer, feminista. Nas suas canções ela faz alusão a outras mulheres como Elza Soares e Carolina de Jesus que, de formas particulares, escancararam, afrontaram toda uma sociedade patriarcal na qual ainda vivemos. Isso é de uma força sem tamanho, porque diz respeito a uma memória, uma tentativa de manter viva essa luta e esses nomes como inspiração para os nossos próximos passos (os nossos passos, mulheres!) em direção ao modelo político e social em que vislumbramos como coerente e não opressor;

– Sua performance em cena é subversiva, porém, não tanto inovadora assim. Larissa abusa do erotismo através das danças, o que provoca uma cisão de padrões geralmente utilizados por outras tantas cantoras mundo afora. Os passos sensuais (e não sexuais) entram em confronto com suas duras e pesadas expressões faciais e, mais ainda, com a carga das narrativas das canções. Esse choque, essa força em palco funciona muito bem e, em grande parte das vezes, deixa o público vidrado, em êxtase. Eu, particularmente, gosto muito desse tipo de atuação que, sem sombra de dúvidas, é também (e mais do que tudo) política. Outras cantoras utilizam-se desse tipo de performance, dentre elas Karina Buhr, Anelis Assumpção. Não se alguma delas inspirou-se em Madonna para isso. O que é certo é que foi a grande rainha do pop que, na década de 1980, ensaiou os primeiros passos desse estilo em palco;

– Não preciso nem falar o quanto foi importante trazer o nome de Larissa para um festival promovido por um sindicato universitário e de esquerda. Nesses tempos difíceis e sombrios que estamos vivenciando e com o retrocesso e o conservadorismo latente na política brasileira, Larissa Luz se consagra como uma das valiosíssimas artistas da resistência.

Resistência no que tange a fala, a provocação, o trazer para o centro pautas que precisam ser debatidas e analisadas com urgência. Certamente que o fazer político não se limita (ou não deveria se limitar) aos muros universitários, nem aos espaços públicos de poder. O fazer político pode e tem que se inserir em toda e qualquer atividade cotidiana. A arte, a cultura é um espaço de fundamental importância para difundir isso;

Bom, a banda pernambucana Cabruêra e o cantor Lazzo Matumbi também se apresentaram, porém, de uma maneira um pouco morna e não tanto impactante como o Ciclanos de Tais e Larissa Luz. Entretanto, o evento como um todo foi bacanérrimo e atraiu um público flutuante de mais de 1000 pessoas, acredito eu. A equipe de produção foi muito comprometida, apresentando ao público um espaço, como diria a gíria popular, 10/10. O que fica é a consciência, a necessidade de inserção de projetos políticos em todas as instancias de disputa, principalmente na cultura, e a prerrogativa de que mais eventos como esse possam acontecer.



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