Pipoca Moderna: Experiências antropofágicas em Vitória da Conquista

Por Mariana Kaoos

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Se tem um texto brasileiro que muito me atrai é o Manifesto Antropofágico, de Oswald de Andrade, escrito lá no inicio do século passado. Nele, no manifesto, o autor tece considerações acerca da nossa constituição enquanto brasileiros (tupy or not tupy?), da nossa formação política, social, cultural, poética.

Antropofagia: Substantivo feminino. Estado, qualidade, condição ou ato do antropófago; antropofagismo; canibalismo.

Não apenas pela participação nas Semanas de Arte Moderna, mas, principalmente, pela ruptura estética e narrativa, Oswald aparece no nosso cenário literário cultural brasileiro como (acredito que) a primeira figura a propor uma nova maneira de criar e consumir arte: deglutindo, mastigando, lambendo a língua. É isso mesmo, meus amigos, a arte passa por um processo de subversão e adquire um teor palpável, onde os seus confins é chegar e ultrapassar todos os limites possíveis. Arte pautando a vida (não se esquecendo que, como Wally afirma, “a vida é sonho”)!

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Apesar de não se declararem escancaradamente antropofágicos, diversos artistas nacionais assumem algumas dessas características que desaguam em suas obras: Glauber Rocha, Caetano Veloso, Hélio Oiticica, Wally Salomão, Rogério Duarte, Rogério Duprat, Zé Celso Martinez, Torquato Neto, Gilberto Gil, Jorge Mautner e por aí vai.

Para além deles, a antropofagia também desagua no cotidiano de tantos outros artistas contemporâneos que pautam a sua produção cultural em novas criações e experiências. Ou, como eles mesmos alegam, pautam a sua produção cultural na prática do afeto.

Semana passada, entre os dias 12 e 15 de abril, uma dessas artistas, dançarina e pesquisadora, para ser mais exata, veio à Vitória da Conquista, para dar uma oficina intitulada Tropifagia: Do Caos ao Corpo. Isaura Tupiniquim, cheia de graças e intensidades mil, propôs um espaço valiosíssimo, calcado em criatividade e subversão. Quem esteve presente, pode conferir, pode perceber no próprio corpo as correntes imagéticas que o prendem e, a partir disso, liberta-lo até alcançar um estado puro de criação.

Clara Mascena, estudante de filosofia e participante da oficina, escreveu um pouco sobre os dias vividos. Confira:

Corpo e heterotopias

 

                                                                                                           *Clara Mascena

Experiência sensível intensa de corpos livres. Corpos dispostos ao movimento, reunidos pelo amor a dança. Experiência livre sensível de corpos intensos. Tão próximos do erotismo quanto da monstruosidade. Da leveza quanto da tensão. Experiência livre intensa de corpos sensíveis. Corpos abertos às proximidades, compassivos às presenças. Partes do corpo-coletivo.

 

Corpos diversos: gordos, magros, pequenos, grandes, pretos, amarelos, flexíveis, envergados, suados, envergonhados… Mas todos corpos caótico-sensuais.
Movimento monstruoso, mastigado, compassado. Movimento rápido de quadril. Movimento suave, miudinho. Movimento de ombro, de braços, de pés, de cabeça. Paixão pelo movimento.

 

Isaura chegou pra falar de baianidade, e falou, mas o que ficou mesmo (de) presente foi o olhar atento ao outro. Como ela mesma disse, renomeando a Oficina Tropifagia: Do caos ao Corpo “pela potência do encontro”. E foi mesmo pela potência do encontro que tudo se construiu.


De terça à sexta-feira (12 à 15 de Abril), e também no sábado, mas ai sem a presença de Isaura em corpo físico, nossos corpos carnavalizaram, carnalizaram, erotizaram. Foram do parangolé a construção denso-arquitetônica. Da antropofagia à mastigação particular do movimento monstruoso. Nossos corpos viveram dias de êxtase e reconstrução.

A oficina Tropifagia: Do Caos ao Corpo, ministrada por Isaura Tupiniquim em Vitória da Conquista se encerrou com a mostra que aconteceu na sexta, dia 15 de Abril, no Centro de Cultura Camillo de Jesus Lima. E isso, por si só já era energético: uma oficina e mostra sobre movimento num Centro de Cultura parado a mais de três anos. Porém, foi mais que isso: a vinda de Isaura criou e reforçou laços entre nós, e isso é imensurável. Nossos corpos agradecem.

Isaura, um abraço do corpo-coletivo-de-mulheres-intensas-e-sensíveis (Clara, Carol, Carol, Daniel, Didi, Izis, Mariana, Nai, Rosa, Thalita, Xanda.)

 



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