Especial Conquista: Um pouco do show Maria, ocorrido nesse último sábado

Por Mariana Kaoos

Maria Aparecida porque apareceu na vida. Maria Sebastiana porque Deus fez tão bonita. Maria de Lurdes, porque me pediu uma canção pra ela…”

Foto: Amanda Nascto
Foto: Amanda Nascto

A primeira Maria que me lembro de ter conhecido foi a moça que trabalhava na casa dos meus avós, na pequena e pacata cidade de Ibicaraí. Maria era negra, morava num bairro mais humilde da cidade e, se bem me lembro, mal sabia ler e escrever. Era novinha. Bonita. Sempre que eu chegava para passar os fins de semana em Ibicaraí, Maria fazia o bife que eu gostava. Me lembro como se fosse hoje que estabelecemos uma relação de afeto. Eu passava as tardes conversando com ela e ela, por sua vez, me falava de sua família, suas vivências. Quando Maria casou, na mesma igreja em que eu fora batizada, eu fui uma de suas damas de honra. Ah,  que orgulho que eu tive desse momento.

Foto: Amanda Nascto
Foto: Amanda Nascto

A segunda Maria da minha vida foi a minha própria mãe. Digo, Maria é o seu nome do meio. Filha caçula com mais três irmãos de uma cidade tradicional e conservadora do interior. Minha mãe me teve e casou bem novinha. Posso dizer que, na época, era ainda uma menina. Porém, uma menina que sempre foi minha companheira e brincava de boneca comigo e me levava para o seu trabalho (na Apae) em Ilhéus e me ensinou, me mostrou toda uma simplicidade bonita de se levar no cotidiano.

A terceira, mas não menos importante, Maria que em minha existência entrou, foi a personagem da Bíblia Sagrada. Isso mesmo. Como sempre estudei em colégio de freira, Maria, mãe de JC (Jesus Critos), era ideia e mulher presente em meus dias. Apesar de já não mais seguir a doutrina católica, tenho por Maria um profundo respeito e admiração pela sua humildade, devoção, amor e perseverança.

Foto: Amanda Nascto
Foto: Amanda Nascto

A partir daí já não sei mais contar quantas Marias foram inseridas no meu cotidiano e, tampouco, categorizar os valores que eu aprendi em convivência com todas elas. O que posso dizer, no entanto, é da última Maria que conheci. E essa última Maria me veio, a principio, com ar de curiosidade. Deixa eu te explicar melhor: Nesse fim de semana, mais precisamente no sábado, 9 de abril, aconteceu um show no Teatro Municipal Carlos Jehovah, intitulado Maria.

A cantora, Géssica Maria, resolvera prestar uma homenagem às Marias da música popular brasileira. Então, o repertório da apresentação foi composto da seguinte maneira: Três blocos com canções imortalizadas nas vozes de Carmem Miranda (Maria do Carmo), Maria Bethânia, Maria Rita, Maria Gadú e Céu (Maria do Céu). Os músicos que acompanharam Géssica foram os melhores possíveis: Kayque Donnato, Davi Prates, Euri Meira e Eric Lopo. Também rolaram umas participações especiais de peso: Ronaldo Costa, Fillipe Sampaio, Ítalo Silva e Bruno Leituga, que abriu o show com um poema lindíssimo, intitulado Simplesmente Maria.

E bom, o que dizer dessa apresentação? Vou elencar algumas coisas, umas boas, outras ruins, que aconteceram por lá:

. Já me cansei de bater nessa tecla, mas, assim como em todas as apresentações que ocorrem no Carlos Jehovah, o evento não começou na hora certa. Mais de uma hora de atraso e, incrivelmente dessa vez, a responsabilidade não foi por parte do público. Quando deu 20 horas (horário combinado para começar), todo mundo já estava lá, de prontidão, esperando que o portão se abrisse;

– Fiquei impressionada com o tanto de gente que foi conferir o show de perto. Impressionada e feliz, muito feliz. Teve gente que teve que ficar em pé, porque nem a arquibancada e nem o chão do teatro comportavam mais pessoas. Isso, para mim, evidencia que, além de Géssica ter um trabalho consistente e ser respeitada pelo público, o mesmo está voltando os seus olhos para as boas produções locais. E já era hora de começarmos a valorizar os nossos férteis e incríveis artistas da terra, não é mesmo?! ;

– A decoração estava divina, maravilhosa, assinada por Felipe Porto. Tudo muito simples, porém, de um requinte que só. Acho que casou bem com a proposta do show;

– Até a noite de sábado eu não conhecia Géssica pessoalmente. Quando ela entrou no palco eu tive a plena certeza de que ali estava a personificação viva de Oxum. Géssica é forte, sua presença é intensa, marcante. Uma das mulheres mais bonitas que vi na minha vida;

– Ela não tem, contudo, apenas beleza. Sua voz também é bonita, doce, porém precisa, voraz. A sua interpretação na música Rosa, Menina Rosa, ( a quem dedicou à sua mãe de axé, Flávia) foi surpreendente;

– Esse ponto aqui é uma opinião extremamente pessoal de Mariana enquanto pessoa e não enquanto jornalista: Apesar do show ter sido muito bacana, acredito que Géssica poderia ter explorado melhor a obra de duas das cantoras homenageadas: Maria Bethânia e Céu. Digo, as músicas escolhidas foram bacanas, mas extremamente conhecidas e exploradas. O que seria do meu coração se Géssica tivesse escolhido Sol Negro de Bethânia, por exemplo? ;

– As participações especiais foram coisa de outro mundo. Não preciso nem falar do meu encanto por Ítalo Silva e Fillipe Sampaio, dois donos do meu coração. Ronaldo Costa também arrasou no piano e Leituga comoveu a todos com a sensibilidade do seu poema;

– Géssica estava maravilhosa, com os cabelos e maquiagem deslumbrantes e um vestido mais ainda. Contudo, ouvi uns comentários e concordei que o vestido e o salto, naquele momento atrapalhou um pouco sua locomoção em palco. Talvez, se ela estivesse um pouco mais despojada, poderia transitar e dançar melhor;

Bom, todos esses pontos aqui elencados foram marcantes e bonitos. Saí do show de forma leve, querendo, a partir de agora, acompanhar de perto o trabalho de Géssica. No entanto, nada do que foi dito acima me marcou tão profundamente quanto algo em particular. O que aprendi com essa Maria e passei a respeita-la e admira-la ainda mais foi porque, a cada instante da minha curta experiência com ela, percebi o quanto ela, Maria, é agradecida pelas dádivas dos encontros da vida.

Digo, agradecer é um gesto de humildade e reconhecimento. É ter a lucidez de se saber que nenhum caminho pode ser trilhado só. Agradecer é colocar posto, em evidência outras pessoas, outros processos, outras contribuições que fizeram com que determinada coisa pudesse ser concretizada. Trazer em si o dom da gratidão é ter a sensibilidade necessária para abandonar certos vícios como o egocentrismo, a prepotência, o egoísmo. Ou, em outras palavras, saber agradecer é trazer na pele a marca de possuir a estranha mania de ter fé na vida.

Géssica agradeceu a inúmeras pessoas durante toda a sua apresentação. Foram agradecimento sinceros, em que ela ficou com olhos marejados e sorriso bobo no rosto. Achei tão bonito o gesto, digno de uma Maria, que aqui, deixo posto, o meu agradecimento a ela, pelo momento, pela sabedoria e pela beleza da gratidão. Ainda que eu não seja Maria, trago em mim riquezas de todas elas.

 

Abaixo, o poema de Bruno Leituga, Simplismente Maria:

Parece que hoje nos faltou algo de sublime, Maria!

Parece que o sol, naquele lugar no céu, ficou!

Parece que a noite é eterna!

Ao menos choverá em teus olhos, Maria?

Fazer quem sabe florescer atrás da dor.

Maria ferro em brasa.

Maria Sangue músculo e suor – (como diz o poeta).

Marias choram de saudade, choram nas praças…dos filhos que o homem de coturno ceifou.

Uma rosa enforada no deserto do peito de uma Mulher.

As paredes declinam sobre o corpo, memórias:

A tortura do rebento, a bala do fuzil, a faca nas costas da singela crda do coração!

Mas olhe, Maria, é o sol, é a lua, é a vida, é a luz!

Pés descalços, Maria, sinta a terra o corpo natural em estado de guerra! Germinar, respirar o ar; pois para cada rosa embaixo de um cortuno, haverá dez Marias em seu lugar!

 

Salve Maria!

 



Cultura, Vitória da Conquista

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