Especial Conquista: O samba da minha terra deixa a gente mole

Mariana Kaoos

Foto: Amanda Nascto
Foto: Amanda Nascto

Maria Luiza é uma senhora por quem eu tenho muito apreço. Morena, cabelos cheios, grandes, em tom avermelhado. Filha de Oya, signo de escorpião. Luiza tem olhos atentos para o universo. É mulher forte, empoderada. Quando fala, suas expressões faciais condizem com a intensidade do que é dito. Ela muito gesticula. Seus braços quase não ficam parados. Luiza é historiadora, mas não só. Ela gosta de mexer com plantas. De estar perto do verde e de suas árvores e de seu pequeno sítio.

Eu gosto de encontrar, de estar perto dela porque os nossos encontros sempre resultam em poesia. Eu transbordo, acredito que ela também. Aí pinta em mim aquele brilho no olhar e aquela vontade, aquele impulso de sorrir para o universo e de mergulhar de cabeça nos mistérios e encantos que é a existência humana. É só chegar perto de Maria Luiza que Wally, Torquato, Drummond, Álvaro, Manoel, Cecília e Clarice não saem da minha boca. É só chegar perto de Maria Luiza que Bethânia, Gal, Caetano, Milton, Belchior e tantos outros não param de ecoar. É só chegar perto de Maria Luiza e ouvi-la me repreender ao usar o futuro do pretérito para eu compreender que verbo e vida se conjugam no presente (só ele é mais que perfeito) e de acordo com os desejos do meu coração.

Foto: Amanda Nascto
Foto: Amanda Nascto

Nesse último domingo, 21, eu tive o prazer de passar uma tarde blue com Maria Luiza. Nos abraçamos muito. Eu lhe pedi a benção por diversas vezes. E rimos, bebemos cerveja, conversamos, dançamos. Foi uma tarde bonita e pura e intensa e inocente, como há muito eu não sentira. E olha que outras tantas pessoas especiais também estiveram presentes: Alessandra Leal, Maria Eduarda Carvalho, Amanda Nascto, Andre Ottero, Esmon Primo, algumas companheiras da Marcha Mundial das Mulheres e mais artistas locais como o dj Rodrigo Freire e o cineasta George Neri.

Foto: Amanda Nascto
Foto: Amanda Nascto

Na verdade, esse domingo foi o domingo dos encontros. O domingo dos encontros e que só foi possível graças ao mais novo show do Hotel Mambembe, intitulado Na Cadência do Samba. E, sendo esse aquele momento de sempre, em que eu contextualizo a coisa toda, repare bem: Hotel Mambembe é uma proposta musical de Alexandrina Santana e Euri Meira. Ambos são músicos valiosíssimos e inundados de referências e qualidades mil. Juntos ou separados. Enfim. Nesse domingo, eles realizaram o Na Cadência do Samba, lá no reino do Canto do Sabiá. A ideia era de montar um repertório todo voltado para o samba e suas mais variadas ramificações. Samba de raiz, partido alto, samba canção. E, dentro da ideia, não era só o samba, ou a música, como melhor preferirem, o cerne da questão. Dentro da ideia, o horário e formato também contavam muito.

Foto: Amanda Nascto
Foto: Amanda Nascto

Foi pensando nisso que eles optaram por fazer algo durante o dia, com uma pegada mais leve, mais fluida. Tudo bem que o show, que estava marcado para começar às 13 horas, contou com quase duas horas de atraso, mas também, às 15h foi o momento exato em que os amantes do samba e da boa música começaram a chegar. Então, já dá para imaginar o que aconteceu, não?

Acompanhados dos músicos Ronaldo Costa, Davi Prates e Igor Barros, Euri e Xanda, como é conhecida, mandaram ver. Sentaram-se todos ao redor de uma mesa (assim como fazia Vinicius de Moraes), pediram cerveja, água, cachaça e começaram a cantoria. O certo é que, além de agradável, a proposta da mesa, e das conversas com o público entre uma canção e outra, tornou o ambiente aconchegante e amoroso, como se fossem todos amigos que tinham combinado de passar uma tarde juntos. Rolou Berimbau e Canto de Ossanha, bem como Bonde do Dom, Por Causa de Você e até mesmo Mandei Meu Cavaco Chorar, da banda de axé Harmonia do Samba. Rolou sorrisos mil, samba no pé e requebradas gostosas. Rolou encontro, reencontro e expressões e impulsos espontâneos por parte do público.

Gosto de me referir ao bar Canto do Sabiá como um reino porque aquele espaço é mesmo magico. Na parte de dentro há um pouco da história de Vitória da Conquista contada através de fotografias, maquinas e outros objetos culturais. Já na parte de fora, o chão é de terra e varias plantas compõem o cenário. Os passarinhos transitam com os seus mais variados e bonitos cantos. O preço das bebidas, bem como o das comidas, é acessível e o custo para entrar no ambiente não foge a regra. Sabiá, o dono do estabelecimento, mais me parece aqueles reis, num formato de literatura de cordel, que atende a todos com simpatia e cordialidade. Sendo assim, o reino do Canto do Sabiá é um dos poucos lugares onde a produção e consumo de cultura local é de fácil acesso a todos.

E, só para concluir, atrelando o Canto do Sabiá com produções do Hotel Mambembe o resultado é obvio que perpassa por uma delícia orgástica antropofágica cultural. Eu bem tenho reparado que, desde meados de 2015 para cá, Euri tem protagonizado as melhores iniciativas da cidade. São as quartas autorais no Aquarius Gourmet, o show Belchior Elétrico e as participações em projetos de Ítalo Silva e outros tantos cantores da cidade. O Na Cadência do Samba surgiu nesse fim de semana como uma proposta interativa e gostosa. Posso garantir que supriu a carência dos apaixonados pelo samba e posso supor que, assim como eu, todos já estão esperando por mais.

 



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