Conquista: Câmara discute situação caótica dos cartórios

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Foto: Ascom - Câmara de Vereadores
Foto: Ascom – Câmara de Vereadores

Aconteceu nesta sexta-feira, 10, mais um encontro para discutir a situação caótica dos cartórios extrajudiciais em Vitória da Conquista. Há três anos a Câmara Municipal de Vitória da Conquista (CMVC) se reunia para debater essa situação. Dessa vez, uma sessão especial, de autoria do vereador Andreson Ribeiro (PCdoB) e acatada por todos os demais colegas, voltou ao tema que afeta milhares de conquistenses. Participaram da sessão a procuradora da Prefeitura Municipal Juscelma Silva Leão, a defensora pública e titular do 4º DP de Vitória da Conquista, Marta Cristina Nunes de Almeida, a juíza administradora do Fórum João Mangabeira, Julliane Nogueira Santana Rios, a presidente do Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário da Bahia (SINPOJUD), Maria José Santos da Silva, o representante da OAB Vitória da Conquista, Danilo Brandão e a promotora e representante do Ministério Público, Janaina Pereira Fonseca Ricon.

Foto: Ascom - Câmara de Vereadores
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O principal desdobramento da sessão foi a indicação da criação de uma comissão mista para prosseguir com o debate e buscar diálogo com as instituições envolvidas, por exemplo, a Defensoria Pública da Bahia e o Tribunal de Justiça. O presidente da CMVC, o vereador Gilzete Moreira (PSB), se comprometeu com causa. “Essa Casa continuará lutando, fazendo o seu papel. Nós agradecemos as presenças de todos e vamos prosseguir com o debate”, disse. A comissão será composta por representantes da PMVC, pelo vereador Andreson Ribeiro (PCdoB), OAB Vitória da Conquista e pela Procuradoria Jurídica e a Comissão de Direitos Humanos, Cidadania e Defesa da Mulher da Câmara.

Morosidade dos cartórios em Conquista não pode ser permitida – O Vereador Andreson Ribeiro (PCdoB) informou que na Bahia a lei 12.352/2011 autoriza a privatização dos cartórios. Na cidade, o Tribunal de Justiça deu início à privatização nos tabelionatos. “O serviço prestado é ágil, o valor cobrado das taxas são módicos. A população ganhou. Pena que não deu a devida celeridade a privatização aos demais, como o de Pessoas Naturais, Títulos e Documentos e Registro de Imóveis”.

Foto: Ascom - Câmara de Vereadores
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Para o parlamentar, a situação dos cartório de Pessoas Naturais é vexatória. “A pessoa para ter uma senha daquele serviço, que é pago, tem que dormir na fila”. Citou que para encaminhar um procedimento de habilitação de casamento tem que chegar às 18 horas no dia anterior para conseguir uma senha para o dia seguinte. “Não podemos permitir no Estado Democrático de Direito, dentro de uma lógica de serviços pagos, que se tenha uma morosidade como está sendo detectado em Vitória da Conquista”.

O edil afirmou que no Cartório de Títulos e Documentos a morosidade é muito grande. “As poucas pessoas que estão ali criam requisitos que não tem na lei, ofendendo o princípio da legalidade. Penso que devido ao excesso de trabalho ela vai tentando procrastinar a realização daquele registro”. Citou que uma associação não recebeu um kit agrícola porque não conseguiu regularizar a situação, em razão da morosidade do cartório.

Foto: Ascom - Câmara de Vereadores
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Sobre o cartório de Imóveis informou que foi procurado para entrar com uma ação de Restauração de Registro Público. “A pessoa necessitou de uma Certidão de Inteiro Teor, foi ao cartório, pagou o DAJ e não conseguiu”. Segundo ele, o Livro do Cartório estava cheio de traças, o que demonstra a falta de investimento no ambiente para a preservação dos livros. Destacou ainda que juízes e serventuários não têm culpa. “Há um baixo contingente de serventuários e os juízes não são ordenadores de despesa. O orçamento vem de Salvador”.  Para Ribeiro, a sessão foi produtiva: “O pano de fundo não é ser contra ou a favor da privatização. O que queremos é que o Tribunal tome uma enérgica medida. Se vai privatizar ou que crie as condições de um atendimento digno à cidade de Vitória da Conquista”.

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Situação vexatória, indecente e dramática – A defensora pública e titular do 4º DP de Vitória da Conquista, Marta Cristina Nunes de Almeida, lamentou o pouco avanço na resolução dessa problemática, relembrando que há três anos esteve na Câmara para discutir, segundo ela, “essa mesmíssima coisa”. Almeida ilustrou a situação de precariedade retratando o caso do conquistense Gildasio Pereira, hoje residente no Rio Grande do Sul, que perdeu todos os documentos ao ser assaltado. A Defensoria Pública do Rio Grande do Sul e a de Conquista já tentaram acessar as certidões de nascimento e casamento dele, registradas em Conquista, mas não conseguiram. O caso se estende desde o ano passado e Pereira já chegou até a ser preso em decorrência dessa situação. “[Gildasio] continua invisível, continua vulnerável, continua em condições de precariedade absoluta, sujeito a todo tipo de violação”, detalhou a defensora.

Marta Cristina destacou a situação de desestruturação dos cartórios, que ela considera vexatória, indecente e dramática. Lembrou que da reunião realizada há três anos na Câmara ocorreram alguns desdobramentos importantes, mas ainda insuficientes para resolver o problema: o Hospital Esaú Matos e o Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC) contam com postos do cartório de Registro Civil que fazem a emissão de certidões de nascimento. Ela ainda disse recear a privatização dos cartórios, mas admite que se trata de um processo inevitável e que melhorou as condições de atendimento à população. Mas, alertou para o fato de que muitas pessoas não possuem condições de pagar pelas taxas desses serviços, apesar dos preços considerados módicos. Ainda assim, acredita que é possível oferecer um serviço de qualidade nos cartórios públicos, coisa que já acontece em outros estados.

OAB vem mantendo esforços para melhorar os serviços dos cartórios – O advogado Danilo Brandão, representado a Ordem dos Advogados no Brasil (OAB), subsecção de Vitória da Conquista, afirmou que o órgão vem mantendo esforços para melhorar os serviços dos cartórios em Conquista, antes mesmo da lei das privatizações, com reuniões com os desembargadores presidentes do Tribunal de Justiça da Bahia, “propondo soluções e cobrando melhorias”. Para ele a privatização é um processo irreversível, mas que a busca por um melhor serviço será constante.

Seguindo Brandão, mesmo com as privatizações há serviços essenciais para a população que precisam ser oferecidos gratuitamente, como a emissão das certidões de nascimento e óbito. “A Bahia hoje é o estado que cobra a maior taxa de fiscalização na totalidade de emolumentos cobrados”, informou. Para reverter esse quadro de problemas, ele defende uma mobilizão permanente. O advogado reafirmou o compromisso da OAB na busca por melhorias, mas lembrou que o problema não ocorre apenas em Conquista, mas em toda a Bahia. “A OAB está atenta. Vamos unir os esforços necessários para a solução desse problema”, finalizou.

LRF dificulta cessão de servidores pela Prefeitura a Justiça – A representante da PMVC, a procuradora administrativa Juscelma Silva Leão, explicou que o município não tem condições de ceder mais funcionários à Justiça para otimizar os serviços prestado nos cartórios devido à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) que impõe um limite prudencial. A procuradora destacou que o município tem sido bastante sensível no atendimento aos diversos órgãos públicos, com o objetivo de otimizar as suas atividades.

Para ela, a LRF cumpre uma tarefa importante de controle e transparência, critérios pelos quais a Prefeitura preza há vários anos e assegura através do orçamento participativo. Poré, a lei não está acompanhando o dinamismo da cidade, que se destaca pelos investimentos na área social. Leão afirmou que sociedade está clamando por um direito constitucionalmente assegurado e garantiu que vai levar as sugestões apresentadas hoje ao chefe do Executivo.

MP sugere fiscalização em todos os cartórios – A promotora representante do Ministério Público, Janaína Fonseca, externou a sua tristeza por ter de voltar à CMVC mais de 3 anos depois de debater o mesmo tema na própria Casa. Ela disse perceber os avanços alcançados, mas que considera que “eles são mínimos diante da demanda de Vitória da Conquista”. “Peço que não sejam necessárias novas discussões sobre este tema”, concluiu.

Para a promotora, as dificuldades não são exclusividade dos serviços judiciários dos cartórios extrajudiciais. Segundo ela, somente na Vara de Família há 12.780 processos: “É uma realidade realmente difícil a que estamos enfrentando. É triste dizer isso, mas é a realidade da única Vara de Família de uma cidade do porte de Vitória da Conquista”, disse a promotora. Segundo ela, existe boa vontade por parte dos servidores, mas quem precisa resolver é o poder público, através de investimentos para sanar a situação crítica que se agrava cada vez mais. A representante do MP propôs que a comissão que será formada visite todos os cartórios sem se identificarem e testem o atendimento para, posteriormente, fazer um registro relatando as impressões e, depois realizarem uma segunda visita.

Sindicato afirma que Tribunal não tem interesse em organizar o cartório, mas sucatear – A Presidente do Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Estado na Bahia (SINPOJUD), Maria José Santos da Silva, informou que o problema dos cartórios extrajudiciais vem desde 2006. “Sempre alertamos ao Tribunal [de Justiça da Bahia] que os cartórios estavam sucateados, mas ninguém passa o que um servidor passa”, desabafou.

Ela explicou que na época da lei da privatização o sindicato solicitou a realização de concurso público. O concurso foi feito ano passado, mas, segundo Silva, a nomeação deve demorar cerca de dois anos. Para ela, o Tribunal não tem interesse de organizar o cartório, pois “é um dos responsáveis em sucatear os cartórios e trazer essa situação para a sociedade”. Segundo a sindicalista, no município de Teixeira de Freitas encontrou servidores usando máquina de datilografia: “O Tribunal não olha para a sociedade”. Ela denunciou que o problema está em todo estado e sugeriu que, no caso de Conquista, seja organizada uma comissão para relatar os problemas à Ministra Corregedora Nancy Andrighi.

Central de marcação de atendimento é o caminho – A juíza administradora do Fórum João Mangabeira, Julliane Nogueira Santana Rios, reconhece que a situação é muito difícil e vem se arrastando há anos, que preocupa a instituição e vem sendo pauta de diversas reuniões. Para ela a conjuntura é desfavorável, pois falta material, pessoal e capacitação, mas algumas medidas estão sendo tomadas. Desde 2012, o Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas e Documentos conta com uma nova titular. Segundo Rios, “ela tem mudado a conduta cartorial”, buscando solucionar os problemas encontrados.

Já a situação do Cartório de Registro Civil é considerada o ponto crítico. “É sabido das filas que se aglomeram pela madrugada. Pessoas, não raro, vão até ao Fórum, à vara responsável, para dizer que dormem três, quatro noites na madrugada [na fila] e não conseguem [atendimento], porque pessoas vendem a senha”, esclareceu. Segundo Rios, trata-se de moradores ruas: “Isso é um problema extramuros, não tem a conivência dos nossos servidores”, detalhou. Uma solução apontada pela juíza é a criação de uma central de marcação de atendimento, projeto que vem sendo discutido com a Corregedoria Geral da Justiça. Já sobre as falas que apontam denúncias de corrupção nos cartórios por meio do pagamento de propinas, a juíza foi enfática. “Já se ouviu falar, [mas], eu me deparo com uma impossibilidade. O sistema de justiça só funciona com a denúncia”, pontuou estimulando o cidadão a denunciar qualquer tipo de irregularidade que ele testemunhar ou for vítima.

 



Política, Vitória da Conquista

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