Sétima Arte em Destaque: Divergente

Por Gabriel José – Estudante de Cinema da Uesb

divergente

A busca pela própria identidade é o primeiro desafio enfrentado pelos adolescentes. Não é incomum ver jovens pulando de tribo em tribo até acharem aquela com a que mais se identificam. A definição que temos de nós mesmos também muda com o passar dos anos e nossas próprias personalidades se regeneram conforme enfrentamos novas experiências.

É isso o que torna o mundo de “Divergente” tão insano e a ideia por trás de sua premissa deveras interessante: o que aconteceria se a sociedade tentasse estratificar o espírito humano? É uma pena que Neil Burger (do eficiente “Sem Limites”) acabe entregando um filme tão raso quanto este, recusando-se a explorar além da mera superfície sugerida pela trama.Não conheço os livros de Veronica Roth, mas o roteiro de Evan Daugherty (“Branca de Neve e o Caçador”) e Vanessa Taylor (da série “Game of Thrones”) explora pouco os relacionamentos entre seus personagens consigo mesmos e entre eles, não conseguindo o básico, que é dar ao público motivo parasse importar com o destino daquelas figuras. Mesmo a premissa inicial da franquia é usada de maneira mínima e acaba sendo quase que deixada de lado em prol de um romance empurrado goela abaixo da audiência.

A trama se passa em um mundo pós-apocalíptico onde jovens são submetidos a testes psicológicos para fazerem parte das facções que formam a tessitura daquela sociedade (Abnegação, Erudição, Amizade, Franqueza e Audácia). Aqueles com mais de uma aptidão, os chamados “divergentes”, são caçados por serem um perigo ao funcionamento do sistema.

Beatrice (Shailene Woodley) nasceu na facção da Abnegação, que coordena o governo local. Mantendo em segredo o fato de que é uma divergente, ela, agora chamada de Tris, se junta à facção Audácia e passa a ser treinada pelo severo Quatro (Theo James). Quando ela descobre uma trama da Erudição, liderada pela fria Jeanine (Kate Winslet), para tomar o poder e eliminar de vez a “ameaça” dos divergentes, a jovem tem de assumir uma posição e lutar por sua sobrevivência e liberdade.

Não me entendam mal, existem boa ideias no decorrer da projeção e a jovem Shailene Woodley se mostra mais que apta ao desafio de carregar uma franquia cinematográfica nas costas. Mas parece que as prioridades dos realizadores estavam mais em fazer um produto mais “fácil” e menos em contar uma boa história ou explorar melhor as diferenças entre as facções, o que resulta em “suicidas” ao invés de “audazes”, por exemplo.

Considerando o universo violento no qual Tris se envolve ao escolher a facção Audácia, a covardia de Neil Burger em mostrar as consequências dos treinamentos (e, posteriormente, das ações militares) perpetrados pelo grupo, minimiza muito o impacto dessas cenas.

Não estou falando em glorificar a violência, mas em mostrar de maneira mais séria as consequências físicas e emocionais dela, algo que “Jogos Vorazes”, produzido pela mesma Lionsgate/Summit conseguiu tão bem. Algumas mortes que ocorrem no decorrer da projeção não possuem a ressonância dramática que lhes são requeridas, isso porque o diretor Neil Burger parece querer poupar o público de qualquer emoção mais desconfortável.

Até mesmo a direção de arte da fita falha neste sentido, ao criar armas que mais parecem de brinquedo ou maquinários fantásticos com visual pouco funcional. São detalhes que tiram o público de dentro da narrativa e destroem a suspensão de descrença necessária para o bom andamento da trama.

E se Shailene Woodley consegue tirar leite de pedra ao nos dar motivos para torcer por sua Tris, o mesmo não pode ser dito do elenco coadjuvante. Enquanto Ashley Judd e Tony Goldwyn fazem pontas de luxo como os pais da protagonista, personagens que funcionam mais como arquétipos do que como figuras mais tridimensionais, os colegas da heroína jamais se destacam como deveriam, relegados aos papéis de torcer pela garota ou bancar o Draco Malfoy cover de plantão.

Já o par romântico durão e torturado da mocinha, Quatro, é vivido no piloto automático por Theo James. A falta de expressão do rapaz é até compreensível, dadas as circunstâncias expostas posteriormente, mas mesmo nos momentos mais íntimos entre o casal principal há pouca química entre eles. A exceção vai para um momento singelo, no qual as mãos de Tris e Quatro se tocam.

Já do lado dos vilões, também não há muito a ser dito. Pouco conhecemos de suas motivações e Kate Winslet parece confundir frieza com apatia, não acrescentando muita coisa à sua Jeanine. Mekhi Phifer, que já teve seus dias de intensidade, também passa em brancas nuvens por aqui. Por incrível que pareça, quem se sai melhor é Jai Courtney (de “Duro de Matar – Um Novo Dia Para Morrer” e “Frankenstein – Entre Anjos e Demônio”), que cria uma antipática e intimidadora figura com seu Eric.

No fim das contas, a julgar por este mediano primeiro filme e considerando a concorrência de séries como a já citada “Jogos Vorazes”, é provável que o público não-iniciado mantenha-se indiferente a mais esta franquia, a despeito dos melhores esforços de sua atriz principal.



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